Imagine, leitor, o senhor
entrando em uma livraria e se deparando com um livro, cujo título é “O Guia
Politicamente Incorreta da História do Brasil”, ou outro chamado: “Guia
Politicamente Incorreto da América Latina”. Os títulos chegam a causar algum
impacto, mas, imagine ainda, saber que alguns fatos históricos aprendidos em
sala aula ou tão disseminados na cultura popular, na verdade não são assim tão
simples, como, por exemplo: Che Guevara era um assassino e que não gostava de
roqueiros. Ou que os negros também escravizaram outros negros. Esse são alguns
exemplos que o leitor dos livros citados acima encontrarão, cujo autor Leandro
Narloch – e Duda Teixeira, no “Guia Politicamente Incorreto da América Latina –
não tem medo da polêmica e tenta mostrar uma visão histórica um pouco diferente
dessa de que há sempre vilões e mocinhos.
A História é sempre mais
complexa, porque ao lidar com uma ciência de caráter social e humano, nunca
haverá essa ladainha como em programas infantis: heróis de um lado, sempre
vítimas e em buscar de acabar com o mal, e de outro, vilões à procura de acabar
com suas vítimas. Tratar o Mundo como se fosse apenas preto e branco, bom ou
ruim, não se aplica na História. Quando falamos de acontecimentos passados,
falamos de ações humanas e quando se tratam delas, não é possível tratá-las com
falso simplismo.
Na introdução do “Guia
Politicamente Incorreto da História do Brasil”, o autor descreve esse processo
maniqueísta: “Nessa estrutura simplista, o único aspecto que importa é o
econômico: o passado vira um jogo de interesses e apenas isso.” Confundir o
estudo e a visão complexa da história e deixar de lado o simplismo não é dizer
que o estudo da História deve ser totalmente objetivo, pois a total
objetividade é impossível tratando-se de seres humanos. O que esses dois livros
querem passar é que a História deve ser estudada e analisada a fundo, buscando
compreender pensamentos da época, o que de fato acontecia, e não ficar repetindo os mesmos e velhos chavões.
Ao tratar o passado dessa
maneira, pode-se cometer o erro de achar que analisando os acontecimentos de
maneira mais crítica, o que se faz é negar alguns fatos trágicos. O caso dos
negros, por exemplo. Ao dizer que negros, ao conseguirem sua liberdade, também
escravizados é uma heresia em tempos politicamente corretos, e, principalmente,
negar que os negros sofreram com a escravidão. É claro que os negros sofreram
com a escravidão e ninguém pode negar isso – o próprio livro não o nega. A
questão é a de que os negros não foram somente vítimas, mas como fizeram parte
da escravidão pelo lado dos senhores também. Em um dos trechos em que o autor
trata sobre as mulheres escravas que conseguiam suas liberdades, ele diz:
“[...] assim que conseguiam economizar para comprar alforria, o próximo passo
de muitas negras era adquirir escravos para si própria.” Não é a negação de tudo,
mas apenas mostrar que a escravidão não foi algo tão simples assim para explicado
de forma simplista e maniqueísta: brancos – vilões – e negros – vítimas.
No caso dos índios, o mesmo
aconteceu, já que algumas tribos ajudaram os portugueses a derrubar outras
tribos inimigas ou também que que os próprios indíos devastavam as florestas,
diferentemente daquela imagem pura e épica: “As tribos que habitavam a região
da Mata Atlântica botavam o mato abaixo com facilidade, usando uma ferramenta
muito eficaz.” No caso dos índios da
América Espanhola, alianças com os colonizadores e comemorações quando se
derrotava um tribo ou um império, como os Astecas, eram comuns: “Boa parte dos
povos andinos ficou aliviada com a execução [do imperador Atahualpa] e comemorou
a queda dos incas”. Não que isso justifique a postura cruel dos espanhóis
diante dos Incas ou de qualquer outro povo, mas a questão é a de que os índios
nem foram tão vítimas, como também não foram vilões, e sim, foram agentes de
sua própria história.
Outros dois grandes mitos
retratatos são os de Che Guevara e Símon Bolívar, ambos retratados como grandes
heróis da América. É verdade que os dois tiveram papéis decisivos na Revolução
Cubana e na Guerra de Independência, respectivamente. Mas tratá-los como heróis
implacáveis e como símbolos máximos de um continente já é um pouco de exagero,
ainda que tenham sido grandes personalidades. O guerrilheiro argentino fuzinou
mais do que centenas de pessoas em nome de um ideal – para alguns utopicos, mas
pouco importa, matar por uma ideologia, por qualquer que seja, não deve servir
de justificativa. Ele pregava tais atos como motor da revolução. Leandro
Narloch e Duda Teixeira citam um discurso de Che: “O ódio como fator de luta,
ódio intransigente ao inimigo, que para além das limitações naturais dos ser
humano o converte em uma efetiva, violenta, seletiva e fria máquina de matar.
Nossos soldados têm de ser assim; um povo sem ódio não pode triunfar sobre o
inimigo brutal.” O herói da juventude, também era contra a liberdade artística
e contra a própria contracultura: “O novo governo logo limitou a liberdade
artística e passou a perseguir hippies e roqueiros.
Simón Bolívar, tido como
herói da independência, foi uma figura realmente importante para o que hoje
conhecemos como América Latina, ajudando em sua libertação política. Porém ele
defendia claramente uma ditadura, como ele mesmo disse: “Estou convencido do
tutano dos meus ossos que a América só pode ser governada por um despotismo
hábil.” Hoje tido com um ídolo da esquerda latino-americana, Bolívar era
cultuado por ditadores intitulados de “direita”como Mussolini, que o descreveu
como “herói honesto, empurrado por uma energia incontrolável e às vezes cruel,
semelhante à que animava aos primeiros conquistadores, digna de sua própria
linhagem.” O libertador tinha o mesmo pensamento fascista de
Mussolini: “Se a
minha morte contribuir para que acabem os partidos políticos e se consolide a
União, eu baixarei tranquilo ao sepulcro.”
Portanto a história não pode
ser tratada no velho maniqueísmo, mas deve interpretar e analisar profundamente
os fatos e não ficar presa aos velhos chavões. Deve-se libertar das ideologias
que pretendem apenas doutrinar e manipular, seja ela de cunho socialista,
capitalista, e se focar nos fatos da maneira mais complexa possível. Também não
precisa ser totalmente politicamente incorreta, mas sendo menos maniqueísta, já
está de bom tamanho.
Nenhum comentário:
Postar um comentário