quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013

Os fundamentos e os elementos da Escola Austríaca de Economia

Introdução – A economia de ação e a economia de agregados: A Escola Austríaca e o “Mainstream”
                Ação, tempo e conhecimento são os três pilares fundamentais para a economia. É o que a Escola Austríaca de Economia sustenta há mais de um século. Qualquer ideologia econômica que não entenda que os agentes econômicos agem, em um determinado espaço de tempo e que este último proporciona o conhecimento necessário para suas  ações, está fadada ao fracasso.
Quase todas as idéias defendidas por essa importante escola de pensamento econômico – além de outros ensaios – podem ser encontradas no livro do professor Ubiratan Iorio “Ação, Tempo e Conhecimento: A Escola Austríaca de Economia”1, lançado pelo Instituto Mises Brasil. Ubiratan é um dos pioneiros e estudiosos da Escola Austríaca no Brasil. “Economia e Liberdade” foi publicado em 1995 quando ainda os “o mosquito do austro-libertarianismo”, para citar Walter Block, ainda não haviam picado parte do brasileiros que estão empenhados em defender tais idéias – as de livre mercado, principalmente.
Afirmar que os seres humanos agem não parece ser uma afirmação extraordinária. Até para refutá-la é preciso fazer uma ação. Mas com a economia quase matematizada, na qual agregados econômicos agem e seres humanos são meras fórmulas matemáticas, dizer que seres eles agem parece algo bizarro.
O “mainstream” acadêmico acredita no conceito de equilíbrio econômico, o qual os Austríacos sempre mostraram que não há. Israel Kirzner, um importante economia dessa escola, defende que os mercados tendem ao equilíbrio sem jamais alcançá-lo. Diferentemente de Ludwig Lachmann defende que os mercados não são processos que visam o equilíbrio  Diferenças à parte, a questão é a de que ao tratar a economia e seu agentes como meros agregados, qualquer explicação desse tipo torna-se fracassada.
Núcleo Fundamental: Ação, tempo e conhecimento
                Como dito, ação, tempo e conhecimento são o núcleo fundamental na teoria austríaca. A introdução mostra que a ciência econômica é muita mais profunda do que se pensa:
                A tradição iniciada por Carl Menger em 1871 é um campo vasto e fascinante do conhecimento humano, que transcende a economia, porque se estende ao âmbito mais abrangente das ciências sociais, da filosofia e da cultura humanista. Não foi por acaso que Hayek afirmou que um economista que só enxerga dentro dos limites estritos da teoria econômica, por mais apurados que sejam seus conhecimentos técnicos, nunca será um economista completo.”
                A ação é fundamental para que exista uma relação de trocas dentro da economia. Ação, como argumentava Mises, é a maneira do indivíduo sair de uma situação menos para uma mais satisfatória. Todas as trocas que ocorrem dentro da economia – de compra e venda – derivam da ação humana. Para agir, o homem dispõe de meios, os quais são sempre escassos, já que se não o fossem, não haveria, pois todos os indivíduos estariam sempre satisfeitos.
                A ação é um tipo de eleição, pois os indivíduos devem escolher dentre os melhores (ou que gerem menores custos) meios para satisfazer aquele fim. O homem precisa valorar, ou seja, escolher entre os vários meios possíveis aqueles que o satisfaçam. Um ganho ou benefício é a diferença entre o valor da nova situação em que o indivíduo está em comparação com a anterior.
                Já o tempo em sua concepção dinâmica não é apenas um eixo horizontal ou em que possa ser divido em segmentos sem qualquer relação entre si. O tempo é um fluxo permanente de ações e de experiências, as quais vão aumentando com o decorrer do eixo. É um processo de descobertas. Essa concepção é fundamental para entender o processo de mercado.
                Um empreendedor com o decorrer do tempo adquire novar experiências acertando ou errado, ou seja, desenvolvendo produtos bons ou ruins para os consumidores irá descobrir quais os gostos e preferências destes, e  poderá produzir aquilo que a sociedade precisa e deseja. O mesmo ocorre com a vida pessoal. Ao agir no tempo, adquire-se conhecimento e experiência que nos fará mudar ou não o plano de nossas ações futuras.
                Os seres humanos não podem conhecer tudo. Nem o que nos cerca, muito menos o futuro. Se os indivíduos pudessem conhecê-lo, muitos ganhariam na mega-sena. A não ser que viajemos no futuro – segundo alguns físicos é possível – o nosso conhecimento é limitado ao presente, o que portanto caracteriza a ação como algo imprevisível. Não há certeza de que as ações serão bem sucedidas.
                Continuando com o exemplo do empreendedor, mesmo tendo conhecimento das preferências da sociedade, ele não pode saber se o seu projeto de produto será bem-sucedido por vários fatores: o mesmo ser ruim, o concorrente produzir algo melhor, ou mesmo a empresa dele falir. Os desejos dos consumidores podem mudar com o decorrer do tempo, também. O indivíduo ao agir terá de lidar com a incerteza.
                Os três elementos fundamentais da economia: ação, tempo e conhecimento estão ligados entre si, combinando em uma síntese que pode ser expressa por uma frase do professor Iorio: “Esse núcleo básico da EAE é tão importante que nos permite definir a economia como ação humana nos mercados ao longo do tempo sob condições de incerteza genuína.
             
   Os elementos de propagação: Utilidade Marginal, Subjetivismo, Ordens Espontâneas
Dessa forma, a Escola Austríaca deixa de lado a objetividade da matemática, para dar um enfoque maior              à subjetividade dos indivíduos. Do foco no subjetivismo surgiu a teoria de Utilidade Marginal, desenvolvido por Carl Menger. Ao mesmo tempo, outros dois economistas Leon Walras e William Jevons também desenvolveram essa idéia, mas tentanda dar objetividade a ela.
A teoria proposta por Menger respondeu um antigo problema denominado “paradoxo do valor”: por que o ouro (ou diamante) tem mais valor do que a água (ou o pão). Porque o ouro é mais escasso do que a água, portanto na escala de preferências pessoais, o primeiro está acima e o segundo está na área marginal da escala. Quanto mais unidades na escala de preferências, menor o valor da unidade marginal e vice-versa.
Agora nem sempre essa preferência está ligada à escassez, mas é uma combinação entre “raritas (escassez), virtuositas (valor de uso), complacibilitas (desejabilidade)”. Alguém pode demorar vinte anos para fazer uma grande obra de arte, mas se não tiver utilidade para ninguém, o valor dessa obra será nulo. O livro do professor Iorio tem um grande valor de uso, portanto sua unidade está em um grau muito alto na escala de preferências. Ou também, a desejabilidade é importante para constituição do valor: “Garrafas de vinho quebradas são escassas em bairros limpos, mas nem por isso valem alguma coisa”, como bem demonstrado nesse exemplo do professor, nem sempre o que é escasso tem valor, mas é preciso ser desejável.
As ordens espontâneas na economia mostram como essa é uma ciência mais voltada para o estudo da sociedade e das ações humanas do que para agregados. Assim como é impossível conhecer o futuro, não se sabe qual será o rumo que a sociedade irá tomar. No início do século passado seria impossível alguém acreditar de que seria possível ter acesso às informações sem sair do conforto de nossa casa. Nenhum indivíduo pode mudar a sociedade sozinho, mas é preciso uma combinação de ações que permitam essas mudanças ou os próprios rumos da sociedade.
Por isso é impossível que planejadores centrais e burocratas possam  controlar de fato a economia, pois são muitas ações ao mesmo tempo, são diferentes preferências para fazer qualquer tipo de controle. A sociedade e a economia se constroem e não são construídas.
Um exemplo clássico é o da moeda. Segundo Menger, ela é uma construção social. Em um determinado tempo as pessoas foram vendo que a melhor moeda era aquele que possuía maior valor – durante séculos foi o ouro. A partir do momento em que tentou-se implementar um planejamento da moeda impondo o papel-moeda, o  poder de compra da moeda tornou-se constante.
Os elementos de propagação da ação, tempo e conhecimento na economia são a utilidade marginal, subjetivismo e as ordens espontâneas. Ao resolver o paradoxo de valor, Menger derrubou também o princípio valor-trabalho que vinha sendo usado pelos liberais clássicos. Ao defender a sociedade como uma ordem espontânea, a Escola Austríaca derrubou o mito de que a sociedade pode ser planejada. Que ela possa ser construida por algum ditador.
               A Teoria Austríaca de Ciclos Econômicos
                 Os problemas econômicos acontecem quando há um Banco Central monopolista – é um claro exemplo de pleonasmo, pois o Banco Central é a única instituição que pode criar moeda. Os bancos podem criar moeda virtual. Criando moeda do nada, há uma diminuição nos juros reais, pois com mais dinheiro os bancos podem emprestar mais, aumentando o crédito em circulação. Em um regime de mercado normal, os juros cairiam naturalmente, caso houvesse um aumento na poupança.
                Quando os juros caem em decorrência da expansão monetária e do crédito, acontece o mesmo que aconteceria em um sistema livre: os empresário começam a investir mais nos estágios mais afastados do consumo. A produção torna-se indireta. A renda nesses setores irá aumentar, e como não houve nenhuma poupança prévia, as pessoas irão gastar em mais bens de consumo. Haverá, portanto, uma reversão e uma guerra entre as indústrias de bens de consumo e as de ordem superior para dispor dos bens de capital. Com uma maior demanda, o preços desses bens de capital irão aumentar, assim como a taxa de juros.
                Nesse momento, os projetos que haviam se tornado lucrativos, graças às taxas de juros mais baixas, mostrar-se-ão insustentáveis, pois não havia recursos para esses empreendimentos. Ou seja, a queda nos juros, devido à expansão de crédito criar uma miragem, que possibilitava projetos de longo prazo, mas, ao contrário do que os empresários pensavam, as pessoas continuavam consumindo e não poupando.  Com o aumento da renda, a economia cresceu, porém quando os projetos que geravam essa alta na renda mostram-se maus investimentos, a economia quebra. Desemprego , cancelamento de compras entram em cena. O professor Iorio resume toda essa ilusão:
                “Tudo se passa como se alguém começasse a construir um enorme edifício e, já com a obra em pleno andamento, viesse a descobrir, tarde demais, que os fundos de que dispunha não eram suficientes para levar o projeto até o fim.  Moeda não é poupança!  O máximo que uma expansão monetária pode conseguir é fantasiar-se de poupança durante algum tempo, durante o qual conseguirá iludir os agentes econômicos.”
Função empresarial e sua importância
O mercado, como visto, é um processo de ação no tempo sob incerteza genuína. Ao agir dentro de um mercado, consumidores em potencial escolhem aquelas empresas que as melhor os servem. É a democracia do consumidor. Com o sistema de lucros e prejuízo é possível ver quais empresas foram escolhidas e quais foram “rejeitadas”. Isso ocorre através dos processos de trocas que ocorrem dentro da economia e que derivam da própria ação humana, como já demonstrado.
A função do empreendedor é justamente ver oportunidade de lucros no mercado, ou seja, ao observar as ações, o empreendedor vê qual a melhor maneira de servir aos consumidores. O desenvolvimento da tecnologia é um claro exemplo de como os empreendedores agem para aumentar o conforto da população.
 “A função empresarial, definida mais precisamente, nada é mais do que aquele atributo individual de perceber as possibilidades lucros ou ganhos eventualmente existentes.”
João deseja montar uma oficina mecânica, porém ele não dispõe de um meio, no caso um terreno. Maria, a qual herdou um terreno baldio, que só lhe dá despesas, gostaria de vendê-lo. Ela, porém não sabe que João precisa desse meio. Há uma descoordenação. José, um hábil empreendedor, sabe que Maria tem o meio que João necessita. Ele compra o terreno por 80.000 e revende por 100.000. José tem um lucro de 20.000, Maria se livra das despesas e com esse dinheiro poderá realizar seus fins, e João que poderá abrir sua oficina. A ação empresarial é a de coordenar as ações na sociedade. O empresário é aquele que consegue vislumbrar lucros e através de suas ações gerar uma coordenação social. 
Portanto, também podem anexar à função empresarial na clássica simbiose entre tempo, ação e conhecimento. A função empresarial é uma ação, pois visa empreender em busca de lucro, em um determinado tempo, adquirindo sob a incerteza de que se seu empreendimento será bom ou ruim.

O Intervencionismo do Estado na economia e na sociedade
Definidos todos esses conceitos e outros mais, que podem ser vistos no livro (Vale repetir, não dá para resumir em uma resenha ou artigo todos os conceitos da Escola Austríaca) pode-se perceber que elas são avessas à teoria intervencionista, que vista planejar e intervir na sociedade e, pois, suas ações. Quando o Estado detém o poder de controlar a economia, ele também passa a controlar as liberdade individuais também. A célebre frase de Hilaire Belloc de que "O controle da produção da riqueza é o controle da própria existência humana” resume os danos econômicos e sociais do intervencionismo.
Quando o Estado decide controlar os preços, ele ao invés de melhorar a situação – geralmente quando há inflação – acaba por piorar. Um exemplo é o de controle do preço de leite. Quando o preço deste está muito alto, inibindo os mais pobres de consumi-lo , o Estado decidi impor um preço máximo, as empresas que fabricam leites terão de diminuir seus custos, que estavam altos, por isso o preço alto de antigamente, agora produzirão menos, o que, portanto, faxendo com que haja escassez e apenas aqueles que chegarem primeiro ao supermercado ou à padaria terão acesso ao produto. Por mais boas intenções – e como diria o ditado, disso“o inferno está cheio”- o Estado agravou a situação.
O Estado não deve intervir na economia, segundo os austríacos, pois o mercado ao se deparar com uma situação dessas tentará da melhor forma resolver a situação. Mas é bom deixar claro que o mercado não é uma instituição perfeita e que tudo sabe. Ela apenas tenta resolver os conflitos econômicos da melhor forma.
Para alguns austríacos, a função do governo é prover segurança, saúde e educação. Outros mais “radicais”defendem a total abolição dessa instituição. Algo que gera muito debate, algumas vezes saudável, outras nem tanto. Mas o que todos dentro da Escola Austríaca concordam é que o Estado não deve intervir na economia e na liberdade individual.

Conclusão
                O livro “Ação, Tempo e Conhecimento: A Escola Austríaca de Economia” é uma ótima análise de todos – ou quase – componentes que formam o pensamento da desconhecida Escola Austríaca, a qual é bastante antiga e a que mais demonstrou conhecimento sobre a realidade econômica. Ela funciona. It`s works.
                Ao apresentar o pensamento austríaco, o professor Iorio nos faz pensar sobre nosso atual sistema econômico intervencionista e sobre como a liberdade é um bem precioso. Enquanto o Estado for esse elefante na economia, crises, inflação e miséria – uma das causas está nas próprias intervenções do governo – serão constantes.
                

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