sexta-feira, 28 de junho de 2013

A Grande Depressão revisada

             A Grande Depressão Americana foi, talvez, o maior evento econômico do século. Culpa-se o capitalismo e o estilo de vida americano por sua ocorrência e que sem as intervenções governamentais, a economia americana não teria se recuperado. Porém em “A Grande Depressão americana”, o economista Murray N. Rothbard desvenda alguns desses mitos, mostrando como a culpa não foi do capitalismo, mas da política inflacionária americana, e que, ao contrário do que se pensa, o presidente Hoover ao invés de adotar o liberalismo, criou as bases para o New Deal.
            No começo do livro, o autor demonstra teoricamente a teoria austríaca dos ciclos econômicos. A partir do momento em que o governo, através do Banco Central, expande a oferta monetária, através do crédito bancário, as taxas de juros caem. Pensando que há mais capital disponível, os empresários são levados a investir em bens de ordem mais afastadas do consumo. Porém, não há capital suficiente, pois ao invés de poupar, as pessoas continuam consumindo. Haverá um momento em que, após a contração do crédito, esses investimentos vão se revelar insustentáveis e terão de ser liquidados. Essa é a teoria resumida.
            Discutido o aparato teórico, Rothbard mostra que a política econômica americana durante a década de 1920 foi inflacionária. A forma expansionista seguiu por dois caminhos: os depósitos à vista foram tranformados em depósitos a prazo, o que incentivou os bancos a expandirem o crédito. Outro caminho foi o aumento das reservas bancárias, incentivada pelo Banco Central americano, que reduziu as taxas de aceitações e de desconto. Assim, ao comprar ativos desses bancos, além da compra de títulos do governo, o FED fez com que as reservas dos bancos aumentassem. Portanto, percebe-se como a década de 1920 foi altamente inflacionária.
            Os por ques da inflação são interessantes. Basicamente, esse aumento do crédito tinha como função emprestar para o estrangeiro, principalmente Inglaterra, que sofria com alguns problemas econômicos. Ajudar as exportações agrícolas também estava entre os planos da política econômica. Outro fator importante foi a estabilização inflacionária. Ou seja, com a queda natural dos preços decorrente do aumento da produtividade, a expansão monetária contrabalanceava essa deflação.
            Outro mito é de que o governo Hoover foi liberal. Pelo contrário, mas altamente intervencionista e foi justamente essa postura que impediu o fim da depressão. Aliás, as práticas de Hoover não se diferiram muito das de Roosvelt, o suposto herói da Depressão. Obras públicas, altos salários e política inflacionária foram as práticas adotadas por esse presidente.
            Segundo Rothbard, ao manter os salários altos, o desemprego não seria e nem foi eliminado, mas continuou a aumentar. Os gastos do governo e os impostos só impediam que as empresas privadas pudessem investir mais na produção. E a política inflacionária e o aumento do crédito, além de impedir a necessária queda dos preços, fez com que os investimentos errôneos feitos durante o boom fossem liquidados, mas ainda mais estimulados. A Depressão não teria fim mesmo, com tais práticas.
             A história revisada da Grande Depressão, segundo Rothbard, mostra que esta foi causada e estimulada pelo governo e pelo Banco Central. O capitalismo não é culpado, portanto, desse acontecimento, mas tanto a intervenção do governo para criá-lo, quanto para tentar resolvê-lo, foram os principais responsáveis pela Grande Depressão.

terça-feira, 25 de junho de 2013

Repúdio aos partidos

                Nas manifestações que ocorreram ao redor do Brasil inteiro, em muitos casos, militantes de partidos políticos foram atacados; partidos e alguns movimentos sociais sofreram retaliações. O senador Cristovam Buarque, segundo informou a Carta Capital, defendeu que o momento era de se abolirem os partidos políticos. De maneira específica, por que estes não poderiam participar de protestos? Por que esse “ódio” aos partidos políticos e a seus militantes?
                A formação dos partidos de massa, em que se trouxe como consequência uma distância grande entre a parte superior da hierarquia e a base militante. Situação essa, em que os interesses da base são suplantados, ou nem são ouvidos, pelo alto. Esse conflito impede que os partidos sejam canais, nos quais o povo poderia tentar colocar seus interesses em prática. Ou mais, sequer há um espaço democrático de discussão dentro do partido.
                Representando mais interesses do alto do que os interesses da base, os grandes partidos políticos brasileiros meras casas de aluguel, em que candidatos escolhem partidos apenas para se elegerem ou acordos são feitos para ter mais tempo de propaganda na televisão. Vale lembrar o emblemático caso em que o PT se aliou ao PP, de Paulo Maluf, inimigos históricos, para que o PT pudesse ter mais tempo na televisão.
                Os partidos políticos brasileiros, mais especificamente os grandes, já não representam mais qualquer ideologia específica, propostas efetivas para os problemas. Basta ver qualquer propaganda partidária são sempre as mesmas:  “Vamos investir mais em educação, saúde e segurança.” Mas como fazê-lo? Quais propostas efetivas para realizar tais promessas? Simplesmente não existe, ou se existem não são colocadas em pauta.
                Para reverter esse tipo de situação, seria necessária toda uma maior compreensão de política por parte da sociedade, em que os problemas devem ser identificados e soluções e propostas discutidas. Nesse sentido, a função de um partido age em dois sentidos tanto para colocar em prática os interesses  sociais quanto para ser um dos canais de discussão social. Dessa forma, é preciso compreender e fazer com que os partidos políticos voltem a ter papel de caráter democrático.
                A hostilidade de que sofreram os partidos e seus militantes durante os protestos não tornam a sociedade mais democrática, pelo contrário, torna-a mais vulnerável à ditaduras, nas quais não há necessidade de partidos. Os partidos são canais democráticos, em que pessoas com mesmas ideias se encontram para tentar colocá-las em prática.
               Alguns partidos brasileiros em vigência tiveram um papel histórico fundamental seja na luta por maiores direitos sociais (como alguns partidos trabalhistas, como o PTB de Vargas e, também, o PCB), como na luta contra a ditadura (MDB, atual PMDB) e na redemocratização do país. Há outros novos partidos surgindo  com novas ideias e propostas para o Brasil. Um ponto é querer que os partidos voltem a ter um caráter democrático, seja voltando a ser um canal de discussões quanto para tentar colocar propostas em prática, outro ponto bem diferente é repudiá-los ou desejar aboli-los.

quinta-feira, 20 de junho de 2013

Eutanásia da economia do rentismo

                A recente política governamental de aumento de juros com o intuito de controlar a inflação só exacerba a economia do rentismo: distribuição de renda dos mais pobres para os mais endinheirados. Os impostos, que ao menos no campo teórico, dever-se-ia servir para atender com serviços básicos a população carente serve para pagamento de juros aos rentistas, além de contribuir para solapar a já frágil economia brasileira, reduzindo, nesse sentido, os incentivos aos investimentos.  Não sem razão Keynes pedia a eutanásia do rentista.
                As políticas que beneficiam o rentismo só tendem a inviabilizar o investimento macroeconômico (produtivo), gerador de renda e riqueza para o país. Ao transformar a renda com juros mais tentadora do que o investimento produtivo, é claro que o amor ao dinheiro faz com que os detentores da riqueza prefiram ganhar dinheiro sem precisar se preocupar com a incerteza. Nesse sentido, a taxa de investimento, a qual está em torno de 17% níveis baixos comparados com China e Coréia do Sul, por exemplo, tende a continuar a níveis baixos, prejudicando a geração de emprego e riqueza. O “pibinho” vai continuar cada vez mais “pibiinho”.
                Esse baixo crescimento e a uma possível queda do emprego, decorrente dos baixos investimentos, tendem a exacerbar os problemas sociais, já vigentes no país, em que a falta de mobilidade social traz consigo maior violência e insegurança a todos, inclusive aos rentistas. O baixo crescimento econômico faz, também, com que o governo arrecade menos e, portanto, com que possa gastar mais com ajuda aos desempregados e aos mais necessitados.
                Mas a economia rentismo não apenas inviabiliza o crescimento econômico, e, portanto, a geração de renda e riqueza para o país, como impede que serviços básicos sejam realizados. Com o aumento das taxas de juros a serem pagas aos detentores de títulos do governo, este pagará vultuosas quantias com pagamento de juros. Em contrapartida, gastos com saúde, educação e segurança serão reduzidos para cumprir o pagamento aos rentistas. Nessa situação, não resta alternativa ao governo brasileiro que não a de reduzir os gastos com serviços de cidadania, o que prejudica a toda uma população, dependente desses serviços.
                É nesse sentido que as políticas do bolsa família atua. Segundo os professores Denis Maracci Gimenez e Daví José Nardy Antunes (em artigo denominado:T R A N S F ER Ê N C I A D E RE N D A AOS RI COS E AOS POB R E S N O BR A S I L –NOT A S SOBR E OS J U R OS AL T OS E O BOL S A - F AMÍ L I A”.devido ao pagamento excessivo de juros, os recursos a disposição do Estado são baixos, dessa maneira esse pouco que sobra é utilizado para gastar com essas políticas assistencialistas mais baratos, que por mais que sejam interessantes não chegam ao cerne do problema da desigualdade e da pobreza, em que prevalecem baixa oportunidades e falta de serviços básicos. A economia do rentismo, assim, impede que políticas efetivas, os quais requerem mais recursos,  de redução da pobreza e da desigualdade.
                A economia do rentismo só tende a trazer prejuízos ao país. Com o intuito de reduzir a inflação, o aumento de juros prejudica não só a economia como um todo, gerando desemprego e menos geração de renda, mas inviabiliza que políticas públicas básicas sejam feitas para que toda a população tenha acesso a serviços públicos de qualidade. Talvez seja exagero pedir a eutanásia do rentista, mas se faz necessária a eutanásia da economia do rentismo. Isso sim, não seria exagero algum. 

terça-feira, 18 de junho de 2013

Que não seja apenas uma primavera

             Em meios aos protestos ocorridos nos últimos dias, um amigo lembrou-se da bela música cantada por Sérgio Sampaio “Eu quero botar meu bloco na rua”, um dos símbolos contra a repressão da ditadura. De maneira impressionante, parte considerável do povo brasileiro resolveu colocar seu bloco na rua contra, inicialmente o aumento das tarifas de ônibus, mas, posteriormente, tomando um caráter mais geral contra corrupção e outras mazelas. Louvável a atitude desses manifestantes (não em seu sentido pejorativo como mostra a mídia), mas para que mudanças sociais efetivas sejam feitas nos país é preciso muito mais do que protestos. Estes são apenas primeiros passos para transformações significativas.
               
               Ao contrário do que pode se pensar, o gigante brasileiro já estava acordado desde, para simplificar bastante, as graves do ABC e o movimento das Diretas Já e, posteriormente, os caras-pintadas nos anos noventa, movimentos, mais do que exemplares, foram fundamentais para que a redemocratização brasileira, depois do sombrio período da ditadura militar.
               
               Mas mesmo com toda a movimentação e a exigência da democratização sendo cumprida, infelizmente, tais movimentos dos anos oitenta e noventa não conseguiram realizar mudanças de caráter tão profundo na sociedade brasileira quanto  poderia ser. Mesmo com a democratização, políticos e empresários que se beneficiaram com a ditadura continuam no poder, a corrupção é um fantasma que insiste em não ir embora, a desigualdade, mesmo com significativas reduções nos últimos anos, é um problema grave ser enfrentado e, ultimamente, direitos das minorias ainda não estão a níveis desejáveis. Puras e simples manifestações de protestos, o povo indo às ruas após se revoltar com os problemas faz com que os políticos se sintam pressionados, e devem sê-lo sempre, mas nem sempre se consegue mudar a sociedade de maneira efetiva. Por isso, simplesmente protestar, ainda que louvável e fundamental para a democracia, é muito pouco.
              
                É necessário que o povo seja inserindo, ou melhor, se insira dentro de um debate público mais amplo. Mais do que se revoltar, é preciso pensar o Brasil. Faz-se necessário discutir de maneira contundente os problemas que se alastram na sociedade atual. Discutir, de maneira profunda, questões de caráter histórico, social, econômico e político que atingem a nação brasileira e, posteriormente, se pensar em propostas efetivas para tais enigmas é a chave para que as mudanças significativas ocorram.
             
                Simplesmente protestar, ainda que, novamente, seja uma atitude bela e fundamental, não irá conseguir atingir o cerne de cada problema. Os protestos devem servir para que a própria população brasileira tome conhecimento de que é necessário pensar o Brasil. Pedir à cabeça de políticos, ainda que necessário em muitos casos, não irá mudar o atual sistema político. Necessita-se entendê-lo  e discuti-lo de maneira crítica. Pedir que o governo dê educação de qualidade não fará com que esta melhore de fato. Mais importante, além de protestar contra a falta de recursos públicos destinado aos setores mais essenciais não mudará muito coisa, é discutir o por que a educação (ou qualquer outro serviço público) é de baixa qualidade. Seria apenas uma questão de falta de benevolência dos governantes, ou teria raízes mais profundas, como, por exemplo, o gasto do governo demasiado com pagamento de juros ou, utilizando uma teoria mais “conspiratória” no caso educação, instituições como FMI não teriam um dedo causador da baixa qualidade da educação pública? As desigualdades de renda, como afirmam as esquerdas, não teriam raízes como a liberalização dos mercados mundiais, ocorridos no final dos anos setenta? Ou mais, a falta de direitos trabalhistas ou de outros direitos básicos prescritos na Constituição não teriam um peso na desigualdade de renda, também?
               
             Sobre a corrupção não precisa falar. Seria mais eficaz, não apenas protestar e pedir a cabeça de políticos, mas analisar de maneira mais profunda o por que da corrupção ser um problema tão grave. Esta não seria algo já enraizado dentro da própria estrutura social brasileira, tendo um caráter histórico, por exemplo? Não haveria mais causas do que simplesmente a malevolência dos políticos? A corrupção, também, não estaria nas próprias relações sociais, em que se confunde bens público e bens privados? Corruptos seriam apenas os outros?
                
            Nesse sentido, as redes sociais, fontes agregadoras de pessoas paras protestos, dever-se-ia ser um espaço, não apenas para as pessoas compartilharem as fotos de protestos ou fotos que contenham certos clichês, mas  como ferramentas de ampliação dos debates públicos, em que artigos e opiniões possam ser discutidos de maneira crítica. É um canal de discussão, cujas gerações anteriormente não tinham e que a nossa tem, mas nem sempre a utiliza para tais fins.
                
            Por fim, como demonstrou Reinaldo Azevedo em um dos seus brilhantes textos em “ País dos Petralhas II”, as entidades e organizações foram de certa forma cooptados pelo governo, mais especificamente, pelo PT. Dessa maneira, essas entidades tornaram-se mais lenientes com as ações governamentais. Faz-se, necessário, portanto, que os movimentos,  os quais são um canal para a ampliação do debate público, sejam independentes de qualquer influência governamental ou de partidos que estejam no poder.
               
             Como escreveu o sociólogo Aurélio Munhoz, em um brilhante artigo publicado no site da Carta Capital: “É preciso muito mais que um conjunto de manifestações contra o transporte coletivo ou os excessos nas obras da Copa para que isto ocorra. É preciso que decorra um longo (e, como sempre, sofrido) processo histórico de construção da nossa consciência política e da cidadania, como nos ensina Faoro em sua segunda lição, para que a exploração seja banida da vida nacional. Não é o que ocorre nos protestos em análise, por mais respeitáveis que sejam.”

               
               Os recentes protestos são válidos e importantes tanto para a democracia quanto para que o próprio povo tome conhecimento de que mudanças são necessárias. Porém, a curto prazo os protestos, por si só, podem gerar algumas mudanças, mas se a sociedade brasileira deseja mais, faz-se necessário mais do que simplesmente protestar: os próximos passos devem ser da ampliação do debate público, até para que se possa, de maneira mais efetiva, pressionar os poderosos. Os recentes protestos, que são continuidade dos que ocorreram nos anos oitenta e noventa, devem servir como base de conhecimento para que a sociedade veja a necessidade de um maior debate público. Caso os protestos fiquem apenas na revolta e não avancem para esse passo seguinte, a primavera brasileira será apenas uma primavera: algo passageiro. Que os protestos avancem para o debate público. Que nada disso seja apenas uma primavera. 

O link do artigo publicado na Carta Capital:
http://www.cartacapital.com.br/sociedade/um-processo-lento-e-doloroso-2847.html