INTRODUÇÃO: A VITÓRIA DA ORDEM LIBERAL BURGUESA E A
INGLATERRA COMO OFICINA DO MUNDO
Denominado
por Eric Hobsbawn de “A era da catástrofe” o período que se inicia em 1914 e
chega ao fim com o término da II Guerra Mundial, em 1945 talvez tenha sido um
dos períodos mais trágicos da existência humana. Guerras e crises levaram a
tragédia humana a níveis assustadores. A economia mundial teve um papel salutar
nesse período, pois não apenas durante a catástrofe, mas posteriormente o mundo
anterior à I Guerra Mundial veio a ruir. Em sua obra magistral denominado “ Os
anos de chumbo” (Editora Unesp\Edições Facamp), o professor Frederico
Mazzucchelli traça um panorama das principais economias mundiais nesse período.
O
professor Mazzucchelli inicia sua obra demonstrando como era a ordem anterior à
guerra. Sem dúvida, era o mundo da ordem liberal burguesa do século XIX, em que
o liberalismo econômico reinava na figura da Inglaterra. Devido à precocidade
de sua revolução industrial, ela conseguiu desenvolver sua indústria muito
antes dos demais países europeus. “Os homens práticos”, os quais o autor chama
atenção, foram aos poucos adquirindo conhecimentos e incorporando-os à
produção, devido à simplicidade da tecnologia. A concorrência era aberta a
quase todos, já que não eram necessários grandes somas de capital para a
indústria. Tanto que nessa fase do capitalismo (originário)os bancos ingleses
não eram uma força interna, já que os industriais conseguiam investir na
produção apenas com a acumulação interna de lucros.
A
produção da indústria têxtil, a qual revolucionou o modo de produção, era
voltada para o exterior, principalmente para suas colônias. A própria dinâmica
da indústria têxtil permitiu o desenvolvimento dos setores de bens de capital
(Departamento I). Graças ao desenvolvimento desse departamento foi possível
desenvolver o ciclo ferroviário, que permitiu uma melhor mobilidade e a redução
dos custos, se diferenciou do ciclo têxtil, pois para a construção dessas
ferrovias não bastava apenas a acumulação interna de capital feita pelas
empresas. Nesse sentido os bancos tiveram um papel fundamental na concessão de
crédito.
Do
desenvolvimento da indústria têxtil culminando na ferrovia, a Inglaterra
desenvolveu-se de maneira excepcional. Voltada para o exterior, seus bancos e
indústrias ajudaram a financiar as industrializações atrasadas, principalmente
na Alemanha e Estados Unidos. Seja através do crédito bancário, das exportações
de máquinas e de trabalhadores especializados, que conheciam a tecnologia
simples necessária para a produção, a Inglaterra tornou-se, dessa maneira, a
“Oficina do mundo”, pois ela quem comandava diretamente ou indiretamente a
economia global. Mas sem dúvidas tal fato geraria sua própria contradição: com
o apoio inglês, a indústria alemã e americana desenvolveram-se de maneira
progressiva. A Inglaterra, antes potência soberana, via o surgimento de outras
duas potências. Iniciar-se-iam as rivalidades que gerariam o ambiente para a I
Guerra Mundial nasceram dessa contradição inglesa, que posteriormente
decretariam o fim da “Oficina do mundo”. O mundo mudaria a partir de 1914.
O MUNDO JÁ NÃO É MAIS O MESMO: A PRIMEIRA GUERRA MUNDIAL
A
primeira guerra foi uma tragédia, principalmente pelas mortes geradas durante a
guerra como pelos traumas posteriores. Na economia e na política, seja durante
ou depois da Grande Guerra, o mundo mudou: não era mais possível reconhecê-lo.
A ordem liberal burguesa e a hegemonia inglesa deixaram de existir. Os anos de
paz do século XIX acabaram nas trincheiras dos sangrentos conflitos. O mundo da
glória dava lugar ao mundo do chumbo.
Para
enfrentar a guerra, os países abandonaram o liberalismo desenfreado e adotaram
o planejamento estatal. Controles e a alocação de recursos e força de trabalho
para os esforços de guerras, através do controle estatal determinou a morte do
liberalismo econômico. A economia e a população estavam totalmente voltados
para a guerra. Essa foi tônica do funcionamento da chamada economia de guerra.
Alguns
pontos econômicos da guerra se fazem necessários: a queda do abastecimento de
alimentos e a inflação. Como demonstra o autor, os países envolvidos na guerra
não conseguiam aumentar sua produção de alimentos, fazendo com que as
importações fossem centrais para abastecer tais países. Os mares foram decisivos nesse sentido: os
bloqueios feitos pelos aliados comprometiam o abastecimento dos países centrais,
como a Alemanha, enquanto os aliados conseguiam alimentos devido a enorme rede
global, incluindo os Estados Unidos, países da América e a Austrália, que
realizam tais exportações. A inflação
foi causada devido às enormes expansões monetárias, já que muitos países
precisavam de recursos financeiros e nem sempre a via da tributação era viável.
Os orçamentos se desequilibraram, por
conta dos enormes gastos com a guerra e a queda na tributação, algo impensável
nos anos anteriores à guerra.
Visivelmente
após a guerra, o mundo mudara. A Inglaterra deixara de ser a “Oficina do
mundo”, ou seja, perdera sua liderança global.
Esta se deslocou, aos poucos, para os Estados Unidos, uma potência
isolada. O padrão-ouro, outro componente fundamental para a ordem liberal burguesa tornara-se
inviável, devido à emancipação das massas e pela necessidade da reconstrução
pós-guerra, inviabilizando a defesa do câmbio valorizado.
Após a
I Guerra Mundial, a Era da Catástrofe entraria em uma nova fase: os anos 20 e
30. O Tratado de Versailles, o qual impôs duras sanções à Alemanha traria
consequências ainda mais trágicas. Os vinte anos entre o fim da I Guerra
Mundial e o início da II Guerra foram apenas um ensaio para esta última. A paz
estava severamente comprometida.
O DESASTRE FRANCÊS: A FRANÇA NO ENTREGUERRAS
A
França foi um caso, de certa forma, trágico durante o período. Todos os países envolvidos
diretamente com a guerra sofreram com a inflação e o desequilíbrio das contas
públicas. Após 1921-1922, nos vários países (menos a Alemanha que viria a se
estabilizar um pouco depois), a inflação estaria sob controle. Na França, não.
A incerteza quanto à taxação de capitais, permitiu uma fuga generalizada de
capitais e o refúgio em moeda estrangeira. A inflação decorrente da
desvalorização do franco contaminou a economia francesa. Os setores envolvidos
com exportação foram os únicos que conseguiram produzir e lucrar. Os outros,
declinaram.
A
partir de 1928, a França volta ao padrão-ouro. Para isso, foram necessárias
políticas contracionistas de redução dos déficits e da oferta monetária. Mesmo
ao estabilizar a inflação e as finanças, a economia não se encontrou em uma
espiral de crescimento, mas pelo contrário: o setor de exportações declinaria e
a crise econômica de 1929 seria um choque para os franceses, que insistiram até
em 1936 (diferente dos demais países) continuar com políticas contracionistas,
o que inviabilizou o alívio. Somente a parti da guerra, sua economia voltaria a
crescer de maneira sistemática.
A
França era uma nau sem rumo, como bem disse Mazzucchelli: ora o medo da taxação
de capitais e, consequentemente, sua fuga; o retorno ao padrão-ouro que deveria
trazer a estabilidade; ora os aumentos salariais que dentro do contexto
inviabilizaram os investimentos industriais; ora os momentos de greve. A França
foi um caso melancólico em meio a tempos melancólicos.
A OBSESSÃO FATAL PELO
OURO: A INGLATERRA NO ENTREGUERRAS
A Inglaterra precisava se
reconstruir após a perda da
hegemonia global. Toda a política econômica inglesa, como demonstra
Mazzucchelli, visavam à volta do padrão-ouro: a nostalgia dos anos pré-guerra
era evidente nas decisões econômicas. Mas a tentativa de voltar a ser a
“Oficina do mundo” ou de reviver os gloriosos anos do século XIX tornaram-se
uma obsessão fatal para a Inglaterra, comprometendo, inclusive, seu
crescimento.
O
objetivo da Inglaterra era voltar à paridade entre libra e ouro, e para isso as
políticas econômicas inglesas nos anos 20 foram de ampliar a deflação. Redução
dos salários, juros elevados, contenção das despesas e aumento do fluxo de
capital para a Inglaterra permitiram que as condições para a volta do
padrão-ouro à sua paridade de antes da guerra fossem viáveis. Em 1925, a
Inglaterra voltaria à paridade entre libra e ouro anterior à guerra, mas não
sem graves problemas: as políticas de valorização da libra induziram à
deflação, à queda das exportações e da produção industrial, além do aumento do
desemprego. Mesmo com o crescimento após 1926, a economia inglesa não conseguiu
mais do que um crescimento medíocre nos anos 20.
Nesse
contexto, houve uma mudança significativa na indústria inglesa: as antigas
indústrias, como a têxtil, a do carvão, a do ferro e etc. ruíram. As políticas
de substituição de importações, baixo dinamismo dos países periféricos, a
concorrência internacional, novos produtos e a valorização da libra estagnaram as
exportações inglesas. Porém, esse foi o
ponto de mutação: abriu-se espaço para novas e modernas indústrias, como a
química, automobilística, a de fibras sintéticas, a de engenharia elétrica. A
produção agora estava voltada para o mercado interno, diferentemente dos anos
da ordem liberal burguesa, em que a produção era voltada para a exportação.
Mazzucchelli lembra bem que essa transformação da indústria inglesa não foi
algo consciente, mas foi resultado das políticas deflacionárias e de valorização
da libra, as quais permitiram essa mudança industrial.
O
sombrio quadro do começo dos anos 30 de recessão, desemprego e fragilidade das
contas externas inglesas forçaram a frequentes aumentos nos juros e a pedidos
de empréstimos para França e Estados Unidos. Nesse contexto de crise, já não
era possível mais manter o padrão-ouro: era a hora de abandonar por completo as
lembranças de um passado que não voltaria mais. A libra se desvalorizou,
permitindo que os juros fossem derrubados. A Inglaterra aumentou as tarifas
protecionistas (o que nos anos da ordem liberal burguesa era inviável, já que a
Inglaterra era defensores do livre mercado entre países.) Essa política de
desvalorização da libra permitiu ao governo manobrar a política monetária e
fiscal de maneira a diminuir os impactos da crise. Tanto que a Inglaterra não
sofreu tanto quanto os outros países e conseguiu se recuperar de maneira
rápida. Mesmo assim, como demonstra o professor Mazzucchelli, o crescimento
inglês não foi nada excepcional, mas apenas modesto, com o desemprego ainda
persistindo. Por mais que as políticas de livre mercado fossem deixadas de
lado, a política fiscal inglesa não foi tão expansiva quanto deveria, o que
fomentou esse crescimento medíocre e manteve o desemprego.
UM PAÍS HUMILHADO: A ALEMANHA NO ENTREGUERRAS
A
Alemanha saiu devastada da guerra não somente apenas pelas perdas humana e da
própria guerra, mas foi acusada de ser responsável por ela e, portanto, deveria
pagar reparações aos países aliados. Pior: a economia alemã estava
completamente desorganizada e os grupos políticos radicais de esquerda e
direita estavam cada vez mais ativos, causando instabilidade social. Para
piorar, ainda mais, a França invadira, em 1923, o vale do Ruhr.
A
hiperinflação foi um momento trágico na história da Alemanha. Ao investigar
suas causas, professor Mazzucchelli demonstra de maneira brilhante que a moeda
é, antes de mais nada, uma convenção social, ou seja, é preciso que as pessoas
acreditem que ela tenha algum valor. O pessimismo rondava os alemães,
principalmente a partir de 1921-1922, em que se iniciaram o pagamento das
reparações, em que ocorreu a partilha da Alta Silésia e a invasão do Ruhr pela
França fizeram com que as pessoas ficassem incertas quanto ao futuro da
Alemanha e nesse sentido começou a ter uma corrida por dólares, o que gerou,
por consequência a desvalorização do marco alemão. Além do mais, a política
fiscal e monetária expansionista ajudaram a desvalorizar o marco cada vez mais.
Nesse sentido, a desconfiança quanto ao futuro “encontrou no desequilíbrio
fiscal e na permissividade da política monetária os veículos que permitiram que
a fuga da moeda local se materializasse sem nenhuma restrição”, escreveu de
maneira brilhante o professor Mazzucchelli.
A
estabilização da moeda alemã se deu através da emissão de uma nova moeda
(rentenmark), que deveria trazer de volta à confiança no futuro da Alemanha. As
autoridades monetárias estavam dispostas a manter uma relação estável entre a
nova moeda o dólar e o ouro. Ao contrair
o crédito para manter a paridade estável, o governo alemão pôde aumentar suas
receitas e teve de controlar suas finanças. A economia alemã estava se
estabilizando aos poucos.
O Plano
Dawes foi decisivo para estabilizar a economia alemã: esse plano permitiu o pagamento
escalonado das reparações, Alemanha deveria pagar pelas reparações a partir de
superávits, e, portanto, não poderia mais recorrer às expansões monetárias,
alimentando o fantasma da inflação, para pagar as dívidas. As políticas
econômicas do plano eram visivelmente deflacionistas, mas esse era o sacrifício
a ser feito para manter a Alemanha no caminho certo.
Esse
plano Dawes acabou por despertar o interesse das finanças internacionais para a
Alemanha. Assim, ela conseguiu pagar as reparações através dos empréstimos
feitos pelos Estados Unidos, principalmente. Os empréstimos permitiram que,
após 1926, a economia alemã crescesse, assim como os gastos públicos,
fundamentais para revitalizar a economia. Porém, logo esse crescimento se
desmancharia: o Plano Young que reformulou o Plano Dawes, a queda do fluxo de
empréstimos para a Alemanha , políticas contracionistas e o início da crise de
29 fizeram com que a economia alemã voltasse ao caos.
No
começo dos anos 30, as políticas de Brüning foram de manter o equilíbrio
fiscal, manter o padrão-ouro, cortes de gastos e aumento de impostos, redução
de salários. Tal política deflacionária só fez com que a crise alemã se
agravasse, seja através da queda da produção ou do aumento do desemprego. O
fato é que tal postura de manter as regras liberais tornar-se-iam um prato
cheio para que os radicais ganhassem voz na sociedade e na política. Não à toa,
Hitler, em 1933, viria a assumir o poder.
NASCE UM GIGANTE: OS ESTADOS UNIDOS ANTES E NO ENTREGUERRAS
Os
Estados Unidos ao final do século XIX começaram se tornar uma potência mundial
e começariam em pouco tempo a superar a Inglaterra. A base de desenvolvimento
foi muito semelhante a de sua ex-metrópole: a construção da larga malha
ferroviária foi o centro do desenvolvimento, que ajudou a desenvolver outras
indústrias, como a de aço, carvão. A classe financeira teve um papel
fundamental no que se refere a empréstimos para essa empreitada. Tanto que,
muitos banqueiros tornaram-se industriais, devido essa estreita linha entre a
indústria e o poder financeiro. A
indústria americana pôde se desenvolver de maneira muito superior aos demais
países, inclusive incrementando novas tecnologias à produção industrial.
Diferentemente da Inglaterra, essa produção era voltada para o mercado interno
e não para o externo. Ainda nesse período, o surgimento dos grandes monopólios
foi uma realidade. A economia em larga escala fez com que determinados setores
ficassem concentrados em poucas empresas. Com todos esses elementos, os Estados
Unidos apareciam para o mundo.
Os
Estados Unidos tentaram evitar ao máximo entrar na guerra, devido à sua
política isolacionista. Mas quando entrou, sua economia liberal transformou-se
em uma economia de guerra: o planejamento central alocava os recursos e os
esforços para a indústria bélica. Como no resto dos países envolvidos com o
confronto, o liberalismo cedeu ao planejamento. Porém, ao término da guerra, os
Estados Unidos, por não terem sofrido danos materiais, tornaram-se credores e
exportadores de recursos para os países Europeus. Os americanos foram os
“vencedores” reais da Grande Guerra.
Os anos
20 foram de extrema euforia para os americanos. O crescimento econômico baseado
no crédito e na teia de investimentos entre setores geraram um crescimento
espetacular. As indústrias automobilísticas, de petróleo, setores de
construções e as atividades comerciais, aliados ao crédito fácil permitiram que os consumidores tivessem acesso a inúmeros
bens produzidos em massa, como carros, geladeiras, rádios. As empresas
investiam e lucravam cada vez mais. A prosperidade parecia infinita. O
liberalismo econômico havia permitido
toda essa euforia.
Porém,
foi a própria dinâmica positiva da economia que gerou sua queda: a produção
industrial e as atividades comerciais haviam chegado a um limite, em que os
próprios consumidores estavam satisfeitos e as empresas estavam com altos
estoques. As perspectivas econômicas passaram da euforia para o pessimismo e a
incerteza. As empresas pararam de produzir, simplesmente, e os consumidores de
gastar. Mas a quebra da Bolsa em 1929 foi o momento fatal para a economia
americana.
Na
época da euforia, o crédito fácil e outra fontes não-bancárias fizeram com que
muitos investissem na bolsa de valores. Quando a bolsa quebrou, famílias e
empresas perderam muito dinheiro gerando
uma crise de liquidez, em que os bancos contraíram o crédito, as empresas
reduziram os estoques e as famílias pagavam suas dívidas e não gastavam. O
circuito de gasto estagnou e, portanto, a crise estava instalada.
Para
conter a crise, as primeiras políticas foram de reduzir os juros, porém quando
o pior supostamente havia passado, segundo o pensamento de Hoover, a contenção
de gastos ainda continuava, os bancos estavam prestes a sofrer quebras
generalizadas, devido à falta de regulamentação e a agricultura sofria. O
Estado não promoveu os gastos necessários para aliviar a crise. O pensamento
liberal, temerário à intervenção do Estado, ainda estava muito presente nos
ideais de Hoover e portanto, o Estado não agiu de maneira combativa como
deveria.
Do
mesmo jeito que os Estados Unidos subiram no pré-guerra e continuaram subindo nos anos 20, a década
de 30 derrubou a próspera economia americana. O liberalismo excessivo, muito
presente na mentalidade americana, levou
à crise e não pôde contê-la. Assim como na Alemanha, tal fato geraria uma
mudança de rumo. Um homem faria isso: Frankilin Delano Roosvelt.
O CAPITALISMO MUDA SUA FACE: O CASO AMERICANO E O ALEMÃO
Quando
Roosvelt subiu ao poder suas ações foram de reformar o capitalismo. Para salvar
os Estados Unidos da crise, o Estado passaria a ser ativo na economia. O
capitalismo livre daria lugar ao capitalismo reformado, em que o Estado daria
certas diretrizes ao capital privado. Nascia, com Roosvelt, o Estado de bem-estar
social, fundamental para consolidar a ordem nos anos pós-II Guerra.
Os Estados Unidos abandonaram o
padrão-ouro e permitiram a desvalorização do dólar, a qual fez com que os
preços subissem e as expectativas de investimentos voltassem. Mesmo não sendo
tão eficiente tal política, pois os bancos não expandiram o crédito, ela foi
eficiente em eliminar o fantasma da deflação. No outro sentido das finanças, o
Estado teve uma participação fundamental na regulamentação bancária. Ao salvar
os bancos e impor regulamentações às suas atividades, as quebras bancárias se
reduziram, em contraste com o período anterior, em que ao deixar os bancos
livres e sem ajudá-los, as quebras bancárias eram altas e assustadores e
voltaram a ser instituições seguras para as pessoas depositarem seu dinheiro.
Na contramão do liberalismo, O
New Deal de Roosvelt ajudou a agricultura de maneira substantiva. As políticas
de elevação dos preços agrícolas, seja através da redução das áreas de cultivo,
do controle da produção (restrição dela), ações de conservação do solo, melhor
aproveitamento das terras e a difusão da energia elétrica, empréstimos para
agricultores permitiram que a
agricultura voltasse a produzir.
O New Deal projetava maiores
gastos do governo através de obras para empregar os desempregados e os mais
jovens. O New Deal foi além em ajudar diretamente aos mais necessitados. O
programa de assistência direta ou indireta ajudou muitas pessoas a saírem de
situações desesperadoras para viver com um pouco mais de conforto. Deixada às
forças de mercado, talvez grande parte da população americana não teria
sobrevivido a esses árduos anos.
Apesar da mentalidade dos
orçamentos equilibrados, o que impediu Roosvelt de fazer mais do que fez, o New
Deal foi um passo significativo de fazer com que o Estado intervisse na
economia para salvá-la de sua crise. Foi através dessas intervenções no âmbito
monetário, na regulamentação do sistema financeiro, nas intervenções na
agricultura e na indústria, com o intuito de fazer com a produção voltasse a
crescer, gastos com obras públicos, a fim de diminuir o desemprego, programas
de assistência aos pobres e desempregados permitiram que os Estados Unidos
fossem aos poucos saindo da crise e voltassem a ser uma potência.
Sob o comando nazista, Alemanha implementou
reformas no capitalismo bem radicais. Os bancos e as empresas deveriam ser
submetidas ao poder central de Hitler. O caso mais emblemático é dos bancos, os
quais proveram liquidez, através das poupanças privadas, para que o governo
nazista gastasse em projetos de estimular a economia.
De 1933
a 1936, os programas emergenciais de Hitler visavam dois setores em especial: o
da construção de residências e do setor automobilístico. Nesse último em
particular se viu grande avanços, seja através de investimentos na produção de
carros como na construção de estradas, e além do mais, esse era um setor com
muita ligação com outros setores. Aos poucos, o desemprego e a produção
industrial começavam a dar sinais vigorosos. A partir de 1936, com o II Plano
Quadrienal, o qual visava desenvolver a economia de maneira autônoma, permitiu a
produção de borracha, aço, alumínio e fibras sintéticas. O desemprego
continuava a declinar e com esse aumento na produção de matérias-primas, os
nazistas colocaram em prática o programa de rearmamento. A partir desse
momento, os recursos e os gastos públicos seriam destinados à produção de
armamentos, mesmo que isso causasse redução no consumo. Aliás, como demonstra
Mazzucchelli, os programas de desenvolvimento da Alemanha sempre passaram por
um maior desenvolvimento dos bens de capital e não nos de consumo. Mesmo assim,
ainda até o início da guerra, o consumo continuaria a crescer.
Mesmo
de maneira mais radical, a economia nazista tentou reformar o capitalismo, de
maneira que as forças de mercado estariam submetidas ao poder do Estado. A
elevação do gasto público nos dois momentos, a ajuda à agricultura, semelhante
a do New Deal, permitiram a Alemanha se desenvolver economicamente, reduzir o
desemprego. Assim ela teve forças para enfrentar as humilhações do passado. A
II Guerra Mundial estaria pronta para se iniciar.
A ECONOMIA DE GUERRA: A VOLTA DA TRAGÉDIA
Para
simplificar, a II Guerra foi uma revanche da primeira. Era um momento de
revisar a história e de impor uma superioridade racial (caso da Alemanha). Para
isso, as economias mundiais voltar-se-iam novamente para o planejamento central
e a alocação de recursos e força de trabalho para a guerra. Em todos os países
isso aconteceu, com exceção dos Estados Unidos, que por possuírem vasta
matéria-prima conseguiram aumentar a produção bélica sem prejudicar o consumo.
No
primeiro momento da guerra, as forças do Eixo conseguiram vitórias sucessivas,
mesmo que a Alemanha não estivesse completamente preparada para a guerra. A partir
do momento em que os Estados Unidos entraram na guerra, a União Soviética
conseguiu resistir de maneira heroica à invasão nazista e a produção bélica dos
países aliados aumentou em quantidade e qualidade, a queda das forças do eixo
foram inevitáveis. A superioridade econômica e bélica dos aliados e erros
estratégicos fizeram com que as forças do Eixo fossem derrotas. A paz estaria
de volta.
Porém,
os acordos de paz visavam muito mais a ajuda do que custos. Os Estados Unidos
foram decisivos nesse contexto de empréstimos para a reconstrução da Europa,
inclusive da Alemanha, e do Japão. Diferentemente do pós-I Guerra, os Estados
Unidos assumiram o papel de liderança mundial, ou seja, “a nova oficina do
mundo”.
CONCLUSÃO: OS ANOS QUE MUDARAM O MUNDO
Na brilhante exposição do
professor Mazzucchelli , é possível ver como os anos de chumbo mudaram o mundo.
Ao olhar o mundo em 1945 e compará-lo com 1913, por exemplo, são mundos
completamente diferentes. A ordem liberal burguesa se rompeu, a Inglaterra perdera
sua supremacia. As guerras traumatizam gerações e o Estado, tão temido pelos
liberais, surgira como uma força para evitar as crises econômicas e a pobreza.
Era a face do Estado de bem-estar social, instituição impensável em meados do
século XIX. Um das duas potências globais era um Estado comunista (União
Soviética).
Os anos
chumbos foram, no pós-I Guerra, uma tentativa de voltar a passado que já estava
remoto naquelas circunstâncias: a ordem liberal burguesa, com a supremacia dos
mercados e o padrão-ouro já não acompanhavam mais as necessidades de
investimentos públicos e da emancipação das massas no cenário político. Foi
somente a partir do momento em que tal obsessão foi abandonada a economia pôde
se recuperar da crise e reduzir o desemprego, ver os casos da Alemanha, Estados
Unidos e Inglaterra (bem menos, é verdade.) Era de fato um novo mundo, que
viria a influenciar tanto seus anos imediatamente posteriores como a longo
prazo, ainda de certa forma influencia até hoje, como, por exemplo, a supremacia
americana só é possível entender nesse contexto de vitória nas duas guerra sem
ter sofrido perdas materiais e ter financiado as reconstruções europeias e
japonesas. Era o fim da ideologia do capitalismo livre e da supremacia dos
mercados.