terça-feira, 12 de março de 2013

O que o dinheiro não deve comprar


Resenha de "O que o dinheiro não compra", do filósofo Michael Sandel. 
            
             Para muitos estamos vivendo na época do triunfo do liberalismo e do mercado. A impressão que se tem é de que tudo está à venda. Não existe mais nada sagrado. Na era do mercado, será que existem essas coisas “sagradas”, que o dinheiro não deveria comprar? Essa é a essência do pensamento do filósofo Michael Sandel em seu livro “O que o dinheiro não compra”.
            Na era do triunfalismo do mercado, tudo parece estar à venda. A discussão de Sandel sobre o que não deveria ser vendido é mais do que uma crítica sobre a desigualdade de renda, que o mercado acaba gerando, mas sobre a moralidade e a corrupção que a sociedade mercado geram sobre determinadas questões.
            A sociedade de mercado é um modo de vida baseado nos valores do mercado. Em um mundo em que tudo pode ser trocado, desde que seja voluntário, o dinheiro passa a regir a vida as relações sociais. Por ser neutro em relação à moralidade do comércio, Sandel pergunta se essa neutralidade realmente é boa ou se devemos discutir as questões morais que envolvem o mercado. Sandel fica com a segunda opção.
            Utilizando inúmeros exemplos, o filósofo demonstra que o mercado, ao poder comprar tudo, gera duas consequências: a disparidade entre ricos e pobres, já que o dinheiro passa a dominar as relações; e a corrupção, não somente em seu sentido político, mas na maneira como o mercado degrada determinadas questões.
            Parques de diversão disponibilizam “fura-filas”. Ou seja, a pessoa que não tem paciência de ficar na fila, pode comprar um passe livre e se livrar da espera. O primeiro argumento da desigualdade mostra que somente os que podem pagar para furar a fila. Os mais pobres terão de esperar na fila. Porém, o principal argumento é o de que ao permitir a venda desses passes, o espírito cívico de esperar democraticamente na fila.
            A venda de rins ou de bebês também segue essa lógica. Não só por permitir que os ricos tenham acesso a esses bens, enquanto os pobres somente podem vendê-los, mas que ao permitir a venda, mesmo que voluntária, de rins e bebês, o mercado corrompe e degrada a natureza deles. O corpo humano passa a ser visto como mercadoria, assim como os bebês, que deixam de ser seres humanos, e viram mercadorias.
            O mercado da morte também lucra muito. Sandel em um dos exemplos mostra como ricos compram seguros de pessoas com Aids e outras doenças fatais. Quanto mais cedo a pessoa morrer, mais lucros terá o investidor. Por mais que ambas as partes ganhem: o doente recebe dinheiro para viver, talvez, os últimos meses de sua vida ou para seu tratamento médico; e o investidor ganha dinheiro. Mas há nessa troca uma lógica maquiavélica: o investidor não deseja que esse doente possa viver mais tempo e da melhor maneira possível, mas que ele morra o quanto antes. O culto à morte é a lógica desse tipo de troca. A vida humana perde qualquer valor, mas é algo para ser lucrado.
            Ao degradar e corromper determinados valores e o espírito cívico, o mercado acaba por se transformar em algo muitas vezes macabro. É preciso que os indivíduos se perguntem em qual tipo de sociedade desejam viver e discutir a moralidade de determinadas trocas. Por mais eficiente que o mercado seja, em muitos casos a sociedade perde, em termos de bom convívio, em detrimento dessa maior eficiência. As pessoas precisam se perguntar: mais eficiente ou um convívio mais harmonioso? Ou seja, o dinheiro deve comandar tudo ou existem coisas que o dinheiro não deve comprar?
            

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